Por Mauricio Neves de Jesus*
Quando Wendel Lomar achou aquele bola no segundo pau, na metade da etapa final, e marcou o único gol da tarde, nós, que estávamos no Vidal Ramos Júnior, já vivíamos todos a plena experiência de ser Inter de Lages. Todos os componentes estavam ali: a chuva teimosa, o gramado enlameado, o time brigando por cada bola como se fosse a última da vida. Assim, embora nenhuma análise tática pudesse apontar como chegaríamos ao gol, já que a bola não rolava mais e o preço de um jogador a menos já era visivelmente cobrado, sabíamos que o gol sairia, sabíamos que a vitória era questão de tempo.
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Há outro fator que contribuiu para que a experiência fosse plena. A diretoria abriu os portões da arquibancada coberta para que todos pudessem se abrigar da chuva. Desde criança vi isso acontecer várias vezes. É uma medida que gera uma sensação de união, e ela acaba chegando ao gramado. De repente, tudo é uma coisa só, um só Inter, e todos sabemos como viver assim, no frio, na chuva, contrariando as possibilidades mais prováveis. Joga-se como se vive, disse Francisco Xabier Azkargorta Uriarte, citado por Patrick Cruz na apresentação de Aquelas Camisas Vermelhas.
Era o que fazíamos já no momento em que o gol saiu. Jogávamos do modo como vivemos. Com uma paixão improvável para quem vê o futebol da televisão ou frequenta as modernas arenas. O time estava entregando tudo o que tinha no meio do barro e do tempo que escoava. Havia a luz do futebol de Athos, essa combinação rara de técnica, inteligência e raça; a onipresença de Michel Schmöller; a segurança dos beques Jonas e Wendel Lomar; mas o que importava era a unidade, só a unidade. Éramos o Inter ali reunido, 70 anos de histórias resumidos em dez camisas enlameadas e dando a vida em cada lance.
Só quem entende que o futebol de verdade é o que se joga longe dos grandes estádios pode perceber a grandeza do que foi neste domingo (14/7) o Inter que derrotou o Concórdia. Um time lameiro, identificado com cada um dos torcedores que estavam encarando o vento e o frio - e porque a nossa história é essa mesmo: o Inter nunca nos abandonou e nós nunca abandonamos o Inter. E quem for nesta quarta, às 15h, para ver o Inter enfrentar o Almirante Barroso no Tio Vida esteja certo de que não é apenas pelo futebol. É para ver, firme e forte, aos 70 anos de idade, o Inter velho de guerra.
*Mauricio Neves de Jesus é o autor de "Aquelas Camisas Vermelhas", livro que conta a história do Inter de Lages